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No domingo (16), Gustavo Riveiros Detter, 13, morreu, em um hospital de São Vicente (SP), por complicações decorrentes de um enforcamento. A investigação indica que ele se asfixiou durante um desafio chamado “jogo do desmaio”, no qual os participantes se enforcam até perder a consciência, para acordar em um suposto estado de euforia, semelhante ao experimentado quando se usa drogas. O que mais chocou foi que o adolescente desmaiou em frente à webcam, já que estava transmitindo o próprio enforcamento para amigos, pela internet. No entanto, de acordo com os especialistas ouvidos pelo UOL, a tecnologia nada tem a ver com o ocorrido.
A “brincadeira” não é nova. Segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, entre os anos de 1995 e 2007, pelo menos 82 crianças e adolescentes morreram durante o jogo.
Desde o ano 2000, existe uma associação de pais de vítimas de acidentes por estrangulamento na França, a Apeas (sigla do nome em francês, Association de Parents d’Enfants Accidentés par Strangulation).
No Brasil, há o Instituto DimiCuida, criado pelo empresário Demétrio Jereissati, cujo filho morreu em 2014, aos 16 anos, após realizar o desafio.
Para o psicólogo Rodrigo Nejm, diretor de educação da Safernet Brasil, organização não governamental que defende e promove os direitos humanos na internet, a fatalidade aconteceu em um ambiente virtual porque é lá que os adolescentes passam boa parte do tempo livre, mas o cenário também poderia ser o pátio de um colégio ou a quadra de futebol de um clube.
“A transmissão on-line é a nova forma de estar junto. Acontecimentos como esse, em ambiente digital ou fora da rede, só reforçam a falta de clareza do adolescente sobre os perigos que ele está correndo”, afirma Nejm.
A psicóloga Ana Luiza Mano, do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo, compartilha da mesma opinião de Rodrigo Nejm.
“Hoje em dia, é mais fácil as crianças estarem cada uma em sua casa jogando pela internet do que todas juntas em um lugar só. Seja por falta de tempo, de disponibilidade dos pais para levá-los onde desejam ir ou simplesmente porque preferem ficar no ambiente deles, interagindo on-line”, diz Ana Luiza.
Os especialistas explicam que as práticas dos adolescentes não se modificam com o tempo, apenas se apresentam de forma diferente. E a adolescência sempre foi a época de testar os limites. Não à toa, é nessa faixa etária que muitos jovens experimentam bebida alcoólica, cigarro e outras drogas.
“Falta a noção de que as coisas podem tomar um rumo diferente, tudo é feito na emoção. A influência do grupo também é crucial, o adolescente, mais do que o adulto, tende a agir conforme os amigos, mesmo se tiver de ir contra aquilo que acredita ou concorda”, declara a psicóloga Ana Luiza.
Vida digital
Uma das formas de os pais tentarem evitar acidentes como o que aconteceu com Gustavo é procurarem estar a par do que o filho faz quando está na internet.
Um estudo realizado pelo Centro Regional para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação, patrocinado pela Unesco, de 2015, apontou que 41% dos pais sabem mais ou menos as atividades dos filhos on-line e 11% não têm nem ideia de por onde os menores navegam.
“Adolescentes precisam de supervisão, eles nunca deveriam ficar trancados em seus quartos com computadores e webcams ligados. É assim que também se iniciam crimes sexuais, por meio de imagens e vídeos que são transmitidos para desconhecidos”, diz a pediatra Evelyn Eisenstein, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e coordenadora geral do E.S.S.E Mundo Digital, que promove o Encontro Internacional sobre o Uso de Tecnologias da Informação por Crianças, Adolescentes e Jovens Adultos.
Assim como um pai se preocupa em saber com quem o filho está saindo, também é preciso entender o que a turma faz quando se encontra na internet. E só a convivência oferece essas respostas. “Por que ele gosta de jogar? O que tem nesse jogo? Joga sozinho ou acompanhado? Quem é o personagem do jogo? Tudo isso fala sobre quem é a criança, o que ela sente e pensa”, diz Ana Luiza Mano.
A morte do adolescente Gustavo pode servir como gancho para uma discussão sobre o tema. Só é preciso evitar a tentação de culpar os jogos on-line ou a internet pelo ocorrido. Com os jovens esse discurso pode soar careta e não ter aderência alguma.
“O problema é a maneira como escolhemos usar essas ferramentas, o que pode torná-las prejudiciais ou mesmo fatais para nós”, diz a psicóloga.
Fonte: UOL
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