[:pt] A morte de um garoto de 13 anos por enforcamento, em São Vicente (SP), atribuída ao “jogo de asfixa” ou “shocking game”, reacendeu a discussão sobre as brincadeiras de risco, que envolvem desafios e sacrifícios de adolescentes e que já é praticada por jovens de Uberlândia. Ainda que o jogo tenha sido descartado no inquérito como causa da morte do garoto paulista, a brincadeira pode ser fatal ou deixar sequelas segundo especialistas de saúde, já que para obter a sensação de euforia, o praticante interrompe a passagem de ar dos pulmões ao cérebro. A moda importada dos Estados Unidos, onde foram registradas pelo menos 1.257 mortes por shocking games, chegou ao Brasil há cerca de dois anos, por meio da internet, e começa a ser difundida no interior. Os dados são da instituição Eric’s Cause, que mantém um mapa colaborativo com notificações de mortes e sequelas derivadas do “jogo” no mundo. O levantamento indica três mortes no Brasil atribuídas à prática. Uma delas, envolvendo um garoto de 16 anos no Ceará, em 2014, levou à criação do Instituto DimiCuida, pelo empresário e pai da vítima, Demétrio Jereissati, que é uma das poucas referências em prevenção no Brasil. A outra, que envolveu um garoto de 16 anos em São Paulo (SP), em 2015, estimulou o professor paulista Douglas Roberto Silva a pautar o assunto em uma escola particular de Uberlândia, depois que se mudou para cidade, há um ano. A reportagem do CORREIO participou de uma aula do professor de História e Filosofia, com cerca de 30 alunos do 7º ano do ensino fundamental, de 12 e 13 anos, que confirmaram em uníssono que a prática já alcançou Uberlândia. Vídeos chegam por grupos de WhatsApp e são postados diariamente no Youtube, inclusive, ensinando as diferentes técnicas. Porém, atualmente, o jogo já se propaga pelo “boca a boca”, já que as crianças começam a presenciar a prática. “Há uns dois meses, depois de um racha de bola, dois amigos decidiram fazer o jogo. Um deles se agachou, ficou respirando fundo por 10 segundos e levantou, segurando o ar. Aí, o outro apertou o peito dele e ele começou a cair, meio desacordado. Achei que era brincadeira, mas quando ele voltou, perguntou onde estava, não conseguia se situar”, disse Luiz Cláudio Franco, de 14 anos. “Também vi uma vez na escola onde estudava. Depois que pressionarem o peito do menino, ele caiu como se tivesse morto”, afirmou Phellipe Santos, de 12 anos. Gustavo Ribeiro, de 12 anos, acompanhou uma combinação de desafio após o término de um jogo pela internet. “Os meninos falavam no chat e no microfone que, quem perdesse a maioria das partidas, tinha que pagar um desafio. De que jeito? Pressionando muito para que o outro fizesse o shocking game. No fim, o perdedor ligou a câmera, chamou o irmão e ele fez com que desmaiasse em segundos. Ficamos apavorados e desligamos a câmera”, afirmou Gustavo Ribeiro. Riscos Experimentar, desafiar, pertencer são buscas típicas na adolescência, em busca de uma recompensa subjetiva. Mas, o que mobiliza garotos – 82% dos adeptos dos shocking games, segundo o Instituto DimiCuida – a realizarem brincadeiras que atentam contra a própria vida, mesmo diante do crescente acesso à informação? “As informações são diversas e oriundas das mais variadas fontes. Mas, a maturidade juvenil para avaliar riscos, mesmo aqueles de consequências evidentemente graves, é baixa, pois acreditam que superam tudo, como no videogame. A relação entre virtual e realidade está cada vez mais tênue”, disse a psicóloga Rejane Suely Ribeiro. Como as práticas estão relacionadas a desafios feitos por amigos, também é preocupante que o desejo de pertencer tenha alcançado a dimensão do autosacrifício. “Esse vício em demonstrar força, em ser corajoso, pode indicar um quadro de insegurança e baixa autoestima”, disse a psicóloga. De acordo com o Instituto Dimicuida, o desmaio é uma defesa natural do corpo, por uma perda súbita de consciência quando há insuficiente oxigenação do cérebro. Dependendo do tempo em que demora a restrição de oxigênio, neurônios morrem e podem haver danos cerebrais irreversíveis, levando o indivíduo ao estado de coma ou à morte. Internet Resultados preliminares de uma pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal de São Paulo (USP) e pela Université Paris Ouest apontam crescimento de 3.100% no número de vídeos relacionados a ‘shocking games’ no Youtube, entre 2010 e 2016, quando passou de 500 a 16 mil. “A internet é nossa principal fonte de informação. A maioria dos jovens fica horas trancada no quarto, navegando por todo tipo de conteúdo, sem que os pais saibam”, disse Fernando Henrique Vital, de 13 anos. Este mesmo contexto privilegia a ocorrência de desafios. Porém não há uma relação direta entre jogos virtuais e “shocking games”, como feita após a morte do jovem de 13 anos no interior de São Paulo, que supostamente morreu em um desafio, após perder uma partida de “League os Legends” (LOL). “O desafio é uma forma de punição, até eu já fiz: pedi para meu amigo beber pinga por ter perdido. Quem incita o menino são os amigos, não o jogo. O LOL tem mortes, mas não são violentas”, disse Phellipe Santos, de 12 anos. Proprietário de uma loja de jogos de Uberlândia, Ismael Neto afirma que jogos de asfixia não são uma prática dos jogadores pela internet. “Muita gente participa de jogos eletrônicos competitivos aqui, mas nem apostas acontecem. Quando muito, fazem sessões de jogo direto valendo pizza. Além disso, não há incitação dos jogos a qualquer tipo de sacrifício”, disse Neto. Prevenção “Como os únicos a falarem do assunto são os adolescentes, pelo seu contato com a internet, a maioria das pessoas não acredita que os jogos existem, o que aumenta o risco”, disse Maria Júlia Nobre, de 15 anos. A Reportagem do CORREIO ouviu gestores de 10 escolas estaduais e de cinco escolas particulares – que entraram em contato com o tema apenas após o incidente de São